Opinião

A mobilização política da juventude rural nos últimos anos

Por Joana Tereza Vaz de Moura- UFRN e Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior- mestrando em Estudos Urbanos e Regionais/UFRN, Membros do Laboratório de Estudos Rurais- Labrural/UFRN.

 Os movimentos sociais do campo possuem certa capacidade organizativa na juventude rural, pois conseguem aglutinar os jovens, problematizando diversas questões como: trabalho, saúde, gênero, participação social e uma educação contextualizada com a realidade do campo. São esses debates que instigam os jovens a permanecer no campo, buscando cada vez mais melhorias e garantia de direitos.            De acordo com Abramo (2005),os jovens do campo representam um grupo bastante particular entre os jovens brasileiros, dado os aspectos de vida que permeiam a categoria, as relações sociais presentes no meio rural e as dinâmicas sociais, econômicas e as relações de trabalho. 


            Nos dias atuais, a juventude rural vem se transformando e se tornando uma juventude cada vez mais participativa nas suas localidades, intervindo em espaços destinados historicamente aos mais velhos, pautando as demandas da juventude rural e desenvolvendo atividades para além da agrícola, como artesanato, turismo rural, cooperativismo e outras. 

            Segundo Castro et al.(2009), no início dos anos 2000 a juventude rural passou a ganhar mais visibilidade a partir de espaços próprios de participação. De acordo com a autora, vários movimentos sociais realizaram encontros, congressos e acampamentos, dentre eles: I Congresso Nacional de Juventude Rural (realizados pela PJR e MST), Encontros de Juventude do Campo e da Cidade (MST), Acampamentos da Juventude da Agricultura Familiar (Fetraf), Seminário do Programa Jovem Saber (Contag), VI Campamento Latino Americano de Jóvenes(Via Campesina); esses espaços viabilizaram um maior foco na juventude rural, inclusive fortalecendo a participação juvenil nos espaços de direção desses movimentos.           

            Na direção dos avanços participativos dos jovens rurais no início dos anos 2000, durante primeiro governo Lula, a esfera pública passou a institucionalizar a categoria "juventude" a partir da criação da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) e o Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) em 2005, garantindo políticas públicas e direitos básicos para a juventude brasileira. A SNJ conta com uma pasta de juventude rural que "[...]surgiu na perspectiva de promover ações que garantam qualidade de vida no espaço rural para juventude do campo" (BRASIL, 2014).

            Diante desses avanços institucionais e sociais, a juventude rural no Brasil passou a se organizar de forma mais atuante nos espaços de participação, criando a consciência de si mesmo como atores sociais, reivindicando diversas pautas que são fundamentais para a permanência do jovem no rural no campo, dentre elas, educação contextualizada com a realidade do campo, acesso a políticas públicas voltadas para os jovens rurais, luta pela terra por parte dos filhos de assentados da reforma agrária, cursos profissionalizantes na área agrária, entre outros. 

            Essa pulsão da participação dos jovens no meio rural nos últimos anos pode ser compreendida pela expansão de mecanismos que estimulam os jovens a se inserirem em assuntos e debates que perpassam pela sua realidade, dentre eles, a criação dos fóruns colegiados nos Territórios da Cidadania, que impulsionou o surgimento de câmaras temáticas, e em diversos territórios a juventude possui uma câmara própria da juventude, o que possibilita um ajuntamento dos jovens locais em prol do exercício da cidadania em suas localidades, reivindicando pautas pertinentes as suas necessidades e a ampliação dos Conselhos Municipais de Juventude, criadospela Lei n° 9.012 de 13 de dezembro de 2007.

            Entretanto, o pós 2016 possibilitou para o Brasil um retrocesso nesses processos de ampliação e apoio à participação social da juventude rural. E o jovem do campo não está fora do contexto nacional, o corte nos investimentos em saúde, educação e demais áreas, além de outras medidas prejudiciais aos direitos básicos da população, afetaram significativamente a vida da juventude rural. Mais recentemente, a juventude brasileira pôde sentir de maneira latente os ataques executados de maneira sistemática à sociedade em geral, como por exemplo, o enfraquecimento dos comitês e colegiados, que representavam espaços aglutinadores de participação social para os jovens do campo. 

            A recente extinção de conselhos gestores de políticas públicas, importante ferramenta de participação, por parte do atual governo, representa a necessidade de organização e atuação popular. 

            A conjuntura política atual exige que a juventude protagonize a histórica tarefa de atuação política e social que sempre desempenhou, unificando as pautas das juventudes e pautando novos rumos, frente ao cenário atual de retrocessos e desânimo. Os processos sociais que estão acontecendo no país não podem paralisar a juventude, é necessário que a juventude rural enquanto categoria seja resistência a esses desmontes e ataques ao exercício da participação. 

            Os avanços na ação política e nos espaços institucionais no início dos anos 2000 possibilitou ampliação e avanço na participação social dos jovens do campo, porém, não resolveu os desafios práticos e as barreiras que ainda cercam o exercício participativo da categoria. Os desafios colocados pela atual conjuntura política, abriram as portas para um processo de reorganização da juventude rural, emergindo assim, possibilidades de uma retomada do protagonismo juvenil na atualidade. Experiências de coletivos de juventude de movimentos sociais do campo, como o MST, geram possibilidades de visualizarmos ações de enfretamento aos desafios postos para a juventude. 

            Nota-se que a juventude do MST vem se articulando para a 10ª edição da Jornada Nacional da Juventude Sem Terra, atividade organizada pelo MST que tem como protagonistas os jovens das áreas de Reforma Agrária de todo o país.  Segundo Juliana de Mello[1], do Coletivo Nacional de Juventude do MST, o evento pretende pautar as demandas do movimento reafirmando a necessidade de politizar e envolver os jovens Sem Terra na discussão sobre o contexto atual. Para ela:

Queremos demarcar nossa disposição de pulsar junto às mobilizações da juventude brasileira. É necessário abrir um novo ciclo de esperanças e perspectivas. Construir um projeto de futuro é uma das questões mais relevantes entre a juventude e nós queremos politizar as percepções sobre esse desejo, indicando que às saídas estão na ousadia coletiva de lutar.

            Diante da conjuntura política atual, o que nos resta são mobilizações populares com pautas expressivas como as colocadas historicamente pelo MST e demais movimentos do campo, pois essas têm a força de aglutinar e organizar politicamente a juventude dispersa no meio rural representando assim um ato de resistência.

Para Saber Mais sugerimos para você alguns trabalhos recentes que explicam a importância dos movimentos de juventude no meio rural:

http://www.mst.org.br/2018/03/26/mst-realiza-curso-de-formacao-com-a-juventude-sem-terra.html

http://www.contag.org.br/imagens/f323RevistaJuvRural.pdf

ABRAMO, Helena Wendel; BRANCO, Pedro Paulo Martoni (Org.). Retratos da juventude brasileira: Análises de uma pesquisa nacional. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2005.

BRASIL. Valessio Brito. Secretaria Nacional de Juventude. O que é? 2014. Disponível em: . Acesso em: 09 mar. 2016.

BARCELLOS, Sérgio Botton. A formulação das políticas públicas para a juventude rural no Brasil: atores e fluxos políticos nesse processo social. Tese (Doutorado em CPDA) - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, 2014. 

CARNEIRO, Maria Jose Teixeira. O Ideal Rurbano: campo e cidade no imaginário de jovens rurais. In: SILVA, F.C.T.; SANTOS, R..; Costa, L.F.C. (Org.). Mundo Rural e Política: ensaios interdisciplinares. Rio de Janeiro: Campus, 1998. 

CASTRO, Elisa Guaraná de et al. Os jovens estão indo embora?: Juventude rural e a construção de um ator político. Rio de Janeiro: Mauad Edtra Ltda, 2009.

CASTRO, Elisa Guaraná de. PNRA e juventude rural: 30 anos depois – balanço e apontamentos em um contexto de ruptura institucional. Retratos de Assentamento. v.19, n.2, 2016. pp. 98-124. Disponível em: http://retratosdeassentamentos.com/index.php/retratos/article/view/240. Acesso em: 07 mai.2017.

 CASTRO, Mary; VASCONCELOS, Augusto. Juventudes e participação política na contemporaneidade: explorando dados e questionando interpretações. In:ABRAMOVAY, M.; ANDRADE, E. R.; ESTEVES, L. C. G. Juventudes: outros olhares sobre a diversidade. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade; Unesco, 2007.

MENEZES, Marilda Aparecida de; STROPASOLAS, Valmir Luiz; BARCELLOS, Sergio Botton. (orgs.). Juventude rural e políticas públicas no Brasil. Brasília: Presidência da República, 2014. Disponível em: . Acesso em: 07 mai. 2017.




[1]Entrevista concedida à página do MST. https://www.mst.org.br/2019/08/04/pela-vida-e-por-direitos-jornada-da-juventude-defende-a-educacao-publica.html

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